Projeto inovador visa a descontaminação do sururu de Alagoas
Experimento inicial foi avaliado no Laboratório de Microbiologia dos Alimentos, após convite do Estado
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Jhonathan Pino - jornalista
Apesar de típico do Estado, o sururu é visto com ressalvas por seus consumidores. A poluição do local de onde eles são provenientes é motivo de preocupação e leva à baixa credibilidade que esse molusco apresenta diante da sociedade alagoana.Para obter um produto seguro é necessário garantir a eliminação de contaminantes presentes nos locais onde se desenvolvem, além de manuseio higiênico, sobretudo após a retirada das conchas, e refrigeração adequada. Análises do Laboratório de Microbiologia dos Alimentos da Faculdade de Nutrição (Fanut) da Universidade Federal de Alagoas demonstraram que o primeiro desafio pode ser uma realidade.
A proposta surgiu dos técnicos do Instituto Ambiental Brasil Sustentável (Labs), Thiago Trobeta e Mauro Coutinho, que durante o funcionamento inicial da Unidade de Beneficiamento de Ostras, no município de Coruripe, viram a possibilidade de utilizar os mesmos mecanismos no sururu, molusco mais disseminado em Alagoas. “A adaptação da depuradora tem um custo diferenciado. Trata-se de um procedimento experimental e inicial”, relatou Mauro Coutinho.
O projeto da depuradora é da Secretaria de Pesca e Aquicultura de Alagoas. "A implantação da depuradora de moluscos é um investimento de ao menos R$ 400 mil, feito pela Agência Espanhola de Cooperação Internacional para o Desenvolvimento, que tem o Iabs como gestor financeiro no Brasil. No momento há um apoio financeiro da Prefeitura de Coruripe e a gestão é feita pelas associações de cultivadores de ostra”, disse Edson Maruta, superintendente de Desenvolvimento da Industrialização e Comércio.
Com a ideia em mãos, o Labs e a Secretaria de Pesca solicitaram a Fanut que o primeiro teste de depuração fosse feito no Laboratório de Microbiologia dos Alimentos. “A gente vem realizando pesquisas com moluscos produzidos e comercializados em Alagoas desde 1992, quando realizamos o primeiro estudo sistemático sobre a qualidade do sururu, através de uma parceria com o Instituto do Meio Ambiente de Alagoas e a Deutsche Gesellschaft für Technische Zusammenarbeit - GTZ (Agência Alemã de Cooperação Técnica). Na época, constatou-se que a contaminação se dava nas lagoas, primariamente, mas o sururu desconchado apresentava contaminação por coliformes termotolerantes, conhecidos como coliformes fecais, ainda mais alta”, relatou Ana Cristina Normande, coordenadora do Laboratório.
Em outra pesquisa realizada com o mesmo molusco, foram feitas análises em vários supermercados “e o produto também apresentava qualidade microbiológica comprometida, independente da refrigeração e da aparência mais higiênica durante a comercialização. Trata-se de uma cadeia de produção complexa, por todas estas questões”, explicou Normande.
Em 2007, o molusco pesquisado foi a ostra do mangue, comercializada na praia da Barra de São Miguel por ambulantes, onde ficou constatado, mais uma vez, a qualidade sanitária comprometida dos moluscos de Alagoas. “Desde 2010, o Laboratório vem monitorando as ostras cultivadas no litoral alagoano, em parceria com o SEBRAE-AL e Secretaria de Pesca e Aquicultura, e agora com a depuradora finalmente podemos ser otimistas com relação ao futuro dessa cadeia produtiva”, recordou a coordenadora.
Experiência pioneira
Feito o convite para a experiência pioneira, o Laboratório realizou os primeiros testes. “Após o período de 48 horas de depuração em condições controladas, verificou-se a eliminação de contaminantes microbiológicos, inclusive da bactéria Salmonella, eventualmente presente em moluscos, devido à contaminação das águas de cultivo”, explicou Cristina Normande.
Para avaliar se o processo de depuração provocaria alguma alteração no sabor do sururu, a equipe propôs uma experimentação sensorial, o que prontamente foi aceito pela professora Cristina Normande. Sob a coordenação da professora de Gestão da Qualidade dos Alimentos, Thaysa Brandão, também da Fanut, a degustação do sururu depurado realizada no último 19 de abril.
Foram preparadas duas porções de 600g, uma delas (sem depuração e outra depurada. Alunos do curso de Nutrição, representantes do Labs e da Secretaria de Pesca experimentaram as porções de sururu, e sem saber qual delas era a depurada, tiveram que analisá-los com relação aos parâmtros de sabor, aparência e textura. “A sensação daquela textura arenosa, que muitas vezes leva à rejeição do produto também é uma aspecto de qualidade importante”, explicou a professora Thaysa Brandão.
O sururu, por filtrar a água em seu organismo, acaba concentrando resíduos sólidos, além de microrganismos que podem ser prejudiciais ao consumidor e parece que a depuração produziu resultados favoráveis”, acrescenta Normande.A experimentação superou as expectativas de todos os envolvidos, que ainda puderam se deliciar com o famosos “sururu de capote”, preparado da forma tradicional, só que utilizando o sururu depurado.
Conforme Maruta, caso seja feito em escala industrial, a depuração do sururu acarretará mais custos, mas ao mesmo tempo agregará valor ao alimento. “O molusco é bastante valorizado fora do país, por ser um produto de alto valor nutritivo, mas é subvalorizado em Alagoas. Temos um produto que é fonte de renda ainda subutilizado”, defendeu o técnico. A cadeia produtiva em Alagoas envolve cerca de 3 mil famílias nas cidades de Maceió, Coqueiro Seco, Santa Luzia e São Miguel dos Campos.